….Olhar Para Além de Si…

….Olhar Para Além de Si…

Olhar Para Além de Si

 

Cedo da manhã o celular desperta sinalizando o momento de levantar. Um convite a me despertar também. Minutos depois o ‘bip’ do calendário recorda o aniversário que no dia anterior havia lembrado. Deixo para ligar e dar as felicitações mais tarde. Afinal, as 05:30 da manhã não convém parabenizar um aniversariante. Levar em consideração um sono restaurador que pode estar em processo é importante. Não queremos o felizardo do dia com uma cara de quem apanhou na noite anterior ou fez seu desjejum tomando suco de limão. Bom senso sempre é bem vindo!

Apesar de conhecer um pouco o alvo das homenagens, me contive. Ligo mais tarde! Chegada a hora, ela atende com sua voz calma de sempre. Dirijo a minha alegria em poder compartilhar desta recordação especial. Aniversário é momento realmente de festa. Se está aí, vivo, para relembrar a dádiva, mesmo quando podemos carregar marcas não tão positivas de vir ao mundo pelo não desejo de quem nos carregou no ventre. É a cicatriz deixada por circunstâncias particulares. Cura que talvez o tempo do perdão ainda não tenha dado o jeito de trabalhar.

Na breve conversa o desabafo de quem agradece a lembrança e fica feliz pelas palavras ditas numa hora difícil. O dia era de festa, mas o ambiente era de sorriso fragmentado. Anos cuidando da mãe que com os limites dado pela doença, dava também muito trabalho, limitavam a inteireza das alegrias constantes. Talvez ‘trabalho’ não seja a palavra certa, pois quando o amor assume suas responsabilidades esquece dos desafios. Mas o amor também sofre… cansa…chora…e isto são pequenas labutas que ao coração compete.

Nesta mesma hora fiz o esforço de esquecer as minhas dores. Também não estava num dia tão alegre e perto dos dias de minha amiga aniversariante eu me senti pequeno. Recordei-me de Clarice Lispector e no silêncio dizia para mim mesmo, enquanto ouvia sua alegria pelo dia e sua lamentação pelos anos: “Um amigo me chamou para cuidar da dor dele, guardei a minha no bolso. E fui”.

Sabemos que “cada um de nós compõe a sua história…” como nos fala a bela canção de Almir Sater e, que cada pessoa carrega não apenas o “dom de ser capaz… de ser feliz”, mas, também leva os risos e as dores que lhe são próprias. Nesta crueza da existência onde cada um lida consigo mesmo e com as dificuldades que se deve passar, encontramos carinhos de Deus através das pessoas que são extensão do descanso que o divino oferta em momentos de extremo cansaço. Pessoas aprendidas da vida que a amizade sempre vai olhar para além de si mesma. Olha o outro e já não sabe mais viver sem se ocupar dele também.

Que na travessia de nossas histórias cruzadas com narrações alheias, possamos viver a mística da compaixão. Do olhar verdadeiro que sempre enxerga o que às vezes o sorriso do outro não diz. Adentrar na dor que não nos pertence e saber que ali um coração almeja desacelerar seus batimentos, sentar um pouco, tomar um café na varanda, aliviar-se na presença de quem se ama e se quer bem, é tarefa necessária de quem se diz ‘ser humano’. O outro está li, mas jamais posso me esquecer de que eu estou aqui. Apenas um gesto de distância nos separam.

Meu abraço,

Evandro Carvalho – Seminarista / Diocese de Uruguaiana-RS.

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