DOM ORIONE E A MISERICÓRDIA

A misericórdia de Deus é ponto inicial e fundamental da missão de Jesus no Evangelho de João: “Deus amou tanto o mundo que deu o Seu Filho único para que todo que nele crer não pereça”. As palavras contidas nesses versículos demonstram a finalidade da missão de Jesus de atestar o amor misericordioso do Pai, um amor sem limites e que está ao alcance de todos os seres humanos. É um amor que transparece o encontro de Jesus com sua misericórdia que não vem para condenar, mas para salvar. A misericórdia é o principal atributo de Deus, como essência divina orientada para o mundo e para os seres humanos.

A perfeita e plena epifania da misericórdia de Deus se dá em Cristo na cruz: “Ele, existindo em forma divina, não se apegou ao ser igual a Deus, mas despojou-se, assumindo a forma de escravo e tornando-se semelhante ao ser humano” (Fl 2,6-7). Na vida, obra e mensagem de Jesus Cristo, o amor misericordioso de Deus se torna visível e palpável; Ele é o rosto da misericórdia do Pai, “quem o vê, vê o Pai” (cf. Jo 14,9). Com a sua palavra, seus gestos e toda a sua Pessoa revela a misericórdia de Deus.

A Misericórdia provém do Coração (Cordis) amoroso de Deus e cobre totalmente as nossas misérias (Misere): “Miserecordis” pode ser traduzido do latim como o Amor Misericordioso de Deus que cobre e apaga as nossas misérias, ou ainda “o coração de Deus que vem até à nossa miséria para nos salvar”. Depois, se permitirmos que ela continue agindo em nossos corações, ela começará a nos renovar espiritualmente ou nos permitir renascer, como disse Jesus a Nicodemos: “necessário vos é nascer de novo” (Jo, 3, 7b). A Misericórdia faz com que nasçamos de novo a partir da ação benigna do Espírito Santo em nossos corações: “quem não renascer da água e do Espírito Santo não poderá entrar no Reino de Deus!” (Jo 3,5b), pela ação constante e perene da Misericórdia Divina passamos a nos tornar novas criaturas, como narra São Paulo em sua Carta aos Efésios: “Renunciai à vida passada, despojai-vos do homem velho, corrompido pelas concupiscências enganadoras, renovai sem cessar o sentimento da vossa alma,
e revesti-vos do homem novo, criado à imagem de Deus, em verdadeira justiça e santidade.” (Ef 4, 22 – 24).

Dom Orione, com toda a sua simplicidade e ousadia viveu e mostrou ao mundo que Deus é um Pai verdadeiramente rico em misericórdia. Ele experimentou o amor misericordioso do Pai de uma maneira tão profunda e vital que significou “o coração da sua experiência mística”. Essa vivência marcou com muita intensidade tanto sua espiritualidade pessoal como sua obra carismático-fundacional; sua grande obra em favor dos mais pobres, abandonados, flagelados e excluídos é um fiel reflexo do Amor e da Misericórdia de Deus. O rosto de Deus é o de um pai misericordioso, que está sempre pronto para nos acolher, abraçar, fazer festa e comemorar com
toda a paciência, acolhendo por inteiro cada ser humano. Já pensou na paciência de Deus, na
paciência que Ele tem com cada um de nós? É a sua misericórdia. Sempre tem paciência, tanta
paciência conosco; compreende-nos, está à nossa espera; não se cansa de nos perdoar, se
soubermos voltar para Ele com o coração contrito.

Dom Orione compreendeu muito bem a grandeza da misericórdia de Deus para conosco. Ele relata que em uma de suas pregações a respeit0 desse tema, após a Santa Missa, apresentou-se um homem e pediu para se confessar, porque vivia com angústia e remorso, por ter envenenado a própria mãe e pensava que nunca mais voltaria a experimentar a bondade de Deus em sua vida. O santo da caridade assim se expressou: “o Senhor perdoa tudo, não esqueçamos esta verdade: Deus nunca se cansa de nos perdoar; nunca!” Nós que nos cansamos e não queremos, cansamo-nos de pedir perdão, não nos cansemos jamais, nunca nos cansemos! Ele é o Pai amoroso que sempre perdoa, cujo coração é cheio de misericórdia por todos nós.

Dom Orione viveu e testemunhou este coração misericordioso, seu único desejo era levar todas as almas a Cristo; aprendamos também a ser misericordiosos. Quando o Papa Francisco nos convocou para o ano do Jubileu da Misericórdia, na verdade ele estava anunciando uma necessidade da experiência de Deus, querendo nos reconduzir até o âmago do coração de Deus, pois “Deus é amor” (I Jo 4,16b), conforme afirma São João em sua primeira carta, e não há como conceber o Amor sem a Misericórdia, pois são intrínsecos! Deus é Pai, Deus é Amor, Deus é Misericórdia! Sabemos que ser misericordioso é não julgar as pessoas, pois a Misericórdia não julga os filhos e filhas de Deus e sim os resgata de suas misérias, pois assim nos disse Jesus: “Se alguém ouve minhas palavras e não as guarda, Eu não o condenarei, porque não vim para condenar o mundo, mas para salvá-lo.” (Jo 12,47).

Ser misericordioso significa, então, colocar-se no lugar do outro, descobrir nele o próprio “eu”, percebê-lo e aceitá-lo como próximo e ir ao encontro; estar junto é algo mais radical que somente assisti-lo em sua necessidade material.

Irmã M. Gilse Pereira Dias
Irmã M. Rufina da Luz Pinheiro