GENTE HONESTA

A CARTEIRA PERDIDA

 

Marcamos um encontro no shopping com o Padre Milton e o Padre Rodinei para visitarmos uma pessoa doente. Deixamos o carro no estacionamento do shopping porque era perto do hospital e lá é muito difícil estacionar.

No retorno da visita, andamos algumas quadras e o Padre Milton parou numa espécie de quiosque para tomar uma água. Continuamos nosso caminho. Quando fomos pegar o carro no estacionamento tivemos uma grande surpresa.

– Meu Deus, perdi minha carteira – disse o Padre Milton.

– Procura direito, Padre Milton, procura direito – falou o Padre Rodinei.

– Perdi, sumiu… tinha todos os meus documentos – disse o Padre Milton, todo nervoso, nem parecia palmeirense.

Procuramos acalmá-lo:

– Calma, padre, calma, vamos encontrar.

– Pede para São Longuinho! Lembramos de nosso filme sobre o Santo das Coisas perdidas.

Deu um susto em todos nós. Nada mais trágico que perder documentos. O trabalho para retirar uma segunda via é um drama sem limites. Além dos documentos, dinheiro na carteira, evidentemente padre não tem muito dinheiro na carteira, mas… o que fazer, agora?

Saímos rapidamente de volta ao hospital, cada um vasculhando pela rua. Observamos cada cantinho da estrada, onde paramos o que olhamos, nunca se sabe ao certo onde e quando perdemos alguma coisa. Claro que nesta altura São Longuinho foi chamado para entrar em ação, como sempre. Mas nada… Parece que desta vez o santo estava de folga.

Foi então que voltamos para o shopping e o Padre Milton resolveu ir sozinho no quiosque, onde havia comprado sua garrafinha de água.

Nós três esperávamos o Padre Milton. Nada trágico, afinal, mas foram momentos de ansiedade e expectativa. E, de repente, ele chegou super feliz. 

– Vejam, vejam! –  balançava no ar a carteira com seus documentos, como se fosse um troféu  de uma maratona

Contou-nos que o atendente que estava no quiosque atendendo viu a carteira caída no chão.

O dono do quiosque, por sua vez, viu a foto do Padre Milton, tentou ir atrás, mas ele já tinha desaparecido. Guardou a carteira na gaveta. Contou-nos que quando chegou lá, perguntou se por acaso ele tinha achado uma carteira.

– Depois que o senhor saiu eu vi a carteira no chão, olhei, vi que era sua, tentei ir atrás, mas não o encontrei mais.

E o "senhor honestidade"  continuou: – Eu ia vasculhar  na carteira mais tarde para ver se eu conseguia um telefone ou um endereço para avisá-lo.

O Padre Milton agradeceu e voltou para o shopping.

Nossa, que alegria, está tudo aqui, tudo. Todos os documentos, dinheiro, tudo.

Realmente, neste momento em que ouvimos falar em tantos roubos no país, além de propinas e uma sem-vergonhice tão grande no governo, nosso coração pula de alegria em saber quanta gente honesta existe na nossa pátria.

Este ato de devolver a carteira, nos revela que o brasileiro é honesto, o trabalhador é honesto, aquele que luta é honesto. Nosso povo é bom, é direito, tem honra. A maioria é honesta, embora nunca vimos tanta sem-vergonhice nos escalões do governo e dos grupos  vinculados a eles,  tanta falcatrua, tanta delação e tão poucos presos ainda.

Testemunhar um desconhecido devolvendo a carteira é sinal que o povo continua honesto, claro temos ladrões pernetas de carteira e de bancos, mas o povo que trabalha mesmo é honesto. Isso nos anima a viver melhor e acreditar no próximo.

Foi uma lição e um bálsamo saber que o ser humano continua honesto. A impressão pode ser diferente se focarmos as prefeituras, câmaras, parlamentos e seus comparsas, mas se olharmos ao nosso redor, impera a honestidade.  O mundo mudará se o povo não imitar os governantes, mas estes imitarem os cidadãos honestos do país. Quem sabe amanhã, depois de muitos irem para as grades, haja luz para os próximos políticos serem todos honestos como o senhor do quiosque. Há ainda esperança, pois há muita honestidade no meio de tanta corrupção.

 

 

Pe. Antônio S. Bogaz (orionita), doutor em Filosofia, Liturgia e Sacramentos e

Teologia Sistemática – Cristologia

Prof. João H. Hansen, doutor em Literatura Portuguesa e

Ciência da Religião e Pós-doutor em antropologia