A FLORADA DOS IPÊS – O ATMO FUGAZ

A FLORADA DOS IPÊS – O ATMO FUGAZ

A FLORADA DOS IPÊS

O ATMO FUGAZ

 

 

-Venha vem o espetáculo que eu vi. Um espetáculo para fotografar, convidou Merlene.

– Que mania. Para que fotografar? disse a Luizinha. Vamos contemplar, se é que é tão bonita assim.
– Vamos rápido na entrada da cidade, repetiu Merlene. Os ipês estão floridos.

– Que cores são as flores, Vlada?

– Ah, naquela avenida são roxas. Vou fotografar. Quero colocar no whatsapp. Vou colocar nas imagens da TV, foi a resposta da Merlene.

– Fotografe sim,  mas não deixe de contemplar, insistia Luizinha

– As duas amigas correram para a avenida. Os ipês eram roxos e muito bonitos e no caminho a Merlene falava da beleza das árvores tão lindas.

O que ela não contou é que sua última vista aos ipês roxos tinha sido três dias antes. Luizinha sonhou com a beleza colorida das árvores. Estava bem empolgada e imaginava a florada. Não era novidade, uma vez que as floradas se repetem na sua estação.

– Será que ainda tem flores nas árvores, indagou Luizinha.

– Por certo, eu mesma observei. Tudo estava florido.

Chegaram e ficaram desapontadas. As flores não tinham esperado. A câmara  fotográfica balançava nas mãos, sem utilidade. Os olhares buscavam flores nos galhos, que expunham apenas ramos nus, sem flores e ainda sem folhas. Mesmo que os ipês roxos sejam menos fugazes que os amarelos  e os brancos, sua exibição é bastante rápida. O comentário da Luizinha foi desconcertante.

– Prefiro mil vezes as bouganvilles. Pode até ser que  não são tão fascinantes como os ipês, mas permanecem mais tempo nos galhos.

 As coisas da vida são assim e devemos nos adaptar a elas, uma vez que não  podemos mudar a natureza das coisas. Devemos estar atentos às situações de  nossa existência, que muitas vezes são muito passageiras e fugazes. Demoramos  muito para iniciar um tratamento médico e quando vamos tratar pode ser muito  tarde. Outras vezes, adiamos a visita a um amigo e quando chegamos, pode ser  que ele já está bem longe. Deixamos para depois os estudos para um concurso e  quando pegamos as apostilas nas mãos, não temos mais tempo para todas as  lições.

 É muito difícil saber o tempo das coisas, quando o tempo é como um cavalo  indomável, que atravessa as campinas de nossa vida, sem que sejamos capazes  de domá-lo ou mesmo capazes de mudar seu destino. Tempo é como um barco  que pilotamos. Podemos mesmo interferir na sua direção, mas não na sua  velocidade.

 

Não devemos correr, feito desesperados, para controlar o tempo e possuir os minutos, como se fossem pérolas preciosas. Bem, na verdade, o tempo é pérola preciosa, mas não podemos trancá-los em nossas mãos. Não faz muitos dias que  a filha da Rosa e do Toninho faleceu de repente. Sim, a Néia partiu na juventude e ficamos na maior tristeza. Queríamos amarrar o tempo, mas nem a grande dor dos amigos foi possível mudar a história.

Algumas coisas  nunca podemos mudar, pois depende pouco de nós. Não podemos mudar a hora do sol baixar. Temos que organizar o momento de contemplar o crepúsculo.  Não podemos impor os meses longos que temos que esperar para ser atendido pelos hospitais públicos e mesmo privados. Mas podemos lutar por nossos direitos. Podemos promover mudanças em nossos hábitos. Simples! Algumas coisas não podem esperar. Vá logo visitar os amigos; faça logo seus gestos de caridade, abrace mais rapidamente seus pais e filhos. Aquilo que depender de sua boa vontade, não demore muito. O tempo é fugaz e as floradas são bem rápidas.

 Quando ficar sabendo que os ipês estão floridos; corre fotografar. Mais que fotografar, contemple sua beleza. Pode ser que na próxima manhã, eles tenham desaparecido.

 

 

Pe. Antônio S. Bogaz (orionita), doutor em Filosofia, Liturgia e Sacramentos e

Teologia Sistemática – Cristologia

Prof. João H. Hansen, doutor em Literatura Portuguesa e

Ciência da Religião e Pós-doutor em antropologia

 
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