MAIORIDADE PENAL
CONVERSAS NO VELÓRIO
Noutro dia fomos para um velório. É bem comum celebrarmos as exéquias de pessoas conhecidas, mas outras simplesmente pedem por orações no sepultamento.
Os funcionários do Velório sempre muito simpáticos e acolhedores. Gente que coloca o coração no que está fazendo, deixa uma boa impressão.
Ali estava um jovem senhor que fora morto, segundo os comentários "a boca chiusa", por um menor de idade, acompanhado por outro garoto. Não sabemos se este também era menor ou maior de idade. Acreditavam que o Sr. Luís Manuel, casado e pai de uma menina, talvez tenha reagido ao assalto.
Como não havia câmeras nas imediações, não se sabia ao certo como tudo sucedeu. Um senhor que estava numa janela foi a única testemunha e dele ficamos sabendo o que aconteceu. Sabia pouca coisa ou temia falar.
Aos poucos o velório aumentou o número de pessoas, a esposa chorava e era consolada por seu pai. A menina estava nos braços da avó materna. Dona Lúcia, mãe do falecido, não tinha coragem de se aproximar do corpo inerte do filho. Mas, por devoção e fé, participou das exéquias. Momentos de dor da família inteira. Colegas de trabalho do morto chegavam. Chegavam os amigos.
– Deve-se pegar o assassino. Prendê-lo para sempre.
– Assim fosse. É de menor. Daqui um tempo está solto. Tem que mudar a lei da maioridade penal.
Na exaltação dos ânimos, se dependesse dos amigos do falecido, até o linchamento seria pouco.
– Se prender resolvesse – ponderou alguém mais calmo.
No primeiro instante, queremos que o menor vá para a cadeia e seja julgado e cumpra a pena o mais rápido possível. Pensamos em seguida que deve haver fatores mais sérios e profundos. Embora é mais fácil ser leviano.
-É fácil exigir dos jovens e puni-los gravemente, mas o que temos dado para os jovens da periferia?
– Sim, provocação ao consumismo, nenhuma educação, nem moradia e os maus exemplos dos grandes ladrões dos governantes.
– Esses nunca vão presos. Fazem leis que lhes permite roubarem, inventam fundações para espoliar o dinheiro público e moram em grandes condomínios.
É uma faca de dois gumes. De um lado a violência que traumatiza e de outro lado, a realidade destes jovens que vivem em favelas, desprovidos de moradia, educação, emprego e dignidade. E ainda vem triunfar os grandes corruptos da nação, em prisões sofisticadas e habeas corpus antes mesmo de suas sentenças.
Temos que entender que não podemos tolerar esses abusos. Nem dos menores de idade, que assaltam e matam e nem dos veteranos que há décadas insultam o país com suas leis tão criminosas quanto as carabinas. Se tiver crimes, tem culpados. A culpa, como sempre é da sociedade, é do governo que se banqueteia com propinas, com estádios fantásticos, com fundações inventadas para espoliar os cofres públicos e não fazem nada para servir o povo que paga pesados impostos.
Basta olharmos para os países de primeiro mundo que raramente se vê isso, como a Suécia, Dinamarca, Noruega, Alemanha, França, Inglaterra e outros, onde esta situação não acontece. Nestes lugares todos os bandidos são punidos, em qualquer idade, mas os corruptos chegam a ter a dignidade de tirar a própria vida, por terem perdido a honra. Entre nós, continuam no poder e seguem a chacina da corrupção.
Estes jornalistas sádicos, que lucram audiência com este sensacionalismo apelativo, nunca questionam as razões destes dramas. Estamos numa encruzilhada e a polêmica sobre a maioridade nos revela o quanto não sabemos como dirigir nesta estrada. Esta é a dicotomia da desgraça, de um lado o jovem sem perspectivas de vida, do outro as drogas e a violência. E mais acima, um bando de criminosos dançando nos grandes salões. E no meio desta desventura, os cidadãos honestos – idosos, crianças e adultos – fugindo das balas perdidas.
Pe. Antônio S. Bogaz (orionita), doutor em Filosofia, Liturgia e Sacramentos e
Teologia Sistemática – Cristologia
Prof. João H. Hansen, doutor em Literatura Portuguesa e
Ciência da Religião e Pós-doutor em antropologia