A mística de São Luís Orione

 

“se eu quiser falar com Deus, tenho que olhar pro céu,

 tenho  que tocar a terra, tenho que beijar o irmão”.

 

Os grandes mestres espirituais são portadores de uma mística particular, que é um dom divino que habita sua alma. A mística é o élan entre o ser humano e Deus, seu modo de se relacionar com as realidades transcendentais. Como um artista que percebe nuances da realidade que tantos não sentem, o místico tem uma percepção do universo divino que extrapola as mentes dos seres humanos em geral. E, do mesmo modo, que os artistas são sensíveis às particularidades dos sentimentos e consegue transbordá-los em pinturas, partituras, estátuas e versos, o místico é capaz de transmitir, por palavras, gestos e irradiação espiritual seus sentimentos religiosos mais profundos. Como o artista que toca a profundidade dos sentimentos onde tantos não conseguem deslumbrar, os grandes místicos da humanidade são capazes de tocar o coração de Deus para além de todos os limites da razão e dos sentimentos.

 

OLHAR PARA O ALTO

Notamos em São Luís Orione uma grande sede de contemplação do rosto divino. Quando lemos as páginas de sua biografia, vemos o menino Luís, sob a inspiração da Mamãe Carolina, caminhando pelas ruas da cidade para visitar a gruta de Nossa Senhora das Flores, bem como suas preces aos pés da Virgem. Cremos mesmo que  esta espiritualidade tem sua gênese mais profunda no episódio da rosa que não murchou. Contam nossos padres orionitas mais antigos que certa vez as mulheres piedosas de  Pontecurone colocaram flores no altar de Nossa Senhora. Apesar do tempo meio frio de maio e todas as flores terem murchado, uma flor permaneceu viçosa. O padre do vilarejo anunciou: – Deverá nascer um grande santo nesta cidade. Dias depois, nascera um menino: João Luís Orione. Podemos inferir que nosso Santo nasceu sob a  insígnia da santidade.

Mesmo em meio ao lodaçal do anti-clericalismo, das investidas dos ateístas e da secularização desenfreada, brotou a flor de lótus da santidade e da caridade. Pela mística de São Luís Orione, entendemos que  “é necessário harmonia de ânimo e de desejos, unidade de corações e de trabalho em Cristo. De resto, meus filhos, também a sabedoria humana nos ensina que as dores mais poderosas nos dão as mais altas alegrias interiores e, como sem água não floresce a terra, assim a alma sem lágrimas não floresce aos olhos de Deus. Sem força de espírito, sem sacrifício, sem sofrer, sem cruz, não há virtude”.

Sua formação genuína, profundamente religiosa, e sua mística, fortemente contemplativa, encontra inspiração nos ensinamentos e nas práticas religiosas de seu lar. Apesar da parca  religiosidade  de seu pai, que se convertera apenas por ocasião de sua ordenação sacerdotal, sua espiritualidade brotou, floresceu e frutificou, qual semente fecunda em terra boa.

Seus escritos revelam a grandeza de seu espírito, que busca sempre o rosto divino, como fonte para saciar sua sede da graça celestial

 

UM OLHAR PARA O MUNDO

Sua profunda sensibilidade para sentir a presença divina aquecendo seu coração, não minimiza sua trajetória nos caminhos dos empobrecidos. A força de sua busca incansável pelos “sofredores e abandonados”, como disse mais tarde o Papa Pio XII, vem de sua intimidade com a Divina Providência e de Nossa Senhora. Sua coragem em se lançar nas aventuras caritativas e missionárias, assim como empreendimentos educacionais e pastorais, revelam sua unidade mística com o Senhor.

Quando apreciamos suas atitudes nas adversidades  das suas atividades, sentimos que uma força superior o eleva e o leva a transcender as limitações históricas. Sua mística, que se expressa na sua sensibilidade em sentir a respiração de Deus e o suspiro dos povos, não perde sua racionalidade, que lhe dá segurança, profundidade e equilíbrio. Toca o coração de Deus e, por causa desta graça, caminha na direção da humanidade “que sofre e se anela no nome de Deus”. Seu clamor de fé nos dá ilumina com postura religiosa:  “Ouçamos, ó irmãos, o grito angustiante, de tantos irmãos nossos que sofrem e suspiram por Cristo. Corramos ao Seu encontro como bons samaritanos, servidores de Deus e da Igreja”.

A mística de São Luís Orione revela ainda algumas características peculiares, que são fonte de inspiração para os “partilhadores de seu carisma”. Certamente, sua devoção mariana é luz em seu caminho. Quer servir a Deus como Maria, mergulhando com confiança no coração de Deus e servindo o projeto de seu Filho Jesus Cristo. A devoção aos santos, como mediadores e modelos de serviço são setas em sua vida. A figura de São José, pai bondoso e provedor, fundamenta suas obras paternais, pelas quais quer socorrer e proteger os irmãos mais indefesos e menosprezados da sociedade, por vezes cruel e injusta.

Sua comunhão eucarística o coloca no coração da Igreja. Serve os pobres, para servir a Igreja, serve a Igreja para servir Jesus Cristo e para exaltar o nome de Deus. Em sua mística se percebe integração entre os pobres, a Igreja e Deus. Quer que Deus seja amado, portanto serve os pobres, para que o nome da Igreja seja exaltada e nela seus  filhos  espirituais se sintam acolhidos. 

 

SANTIFICAÇÃO DAS ATIVIDADES E ATIVIDADES QUE SANTIFICAM

 

A mística orionita nos coloca num projeto de vida. Se as grandes escolas de mística apontam a santidade pela prece ou pela ação, São Luís Orione nos aponta um caminho de santificação que se concretiza pelas próprias ações. Toda mística nos eleva na busca de Deus, para nos alimentarmos de seu espírito e de sua graça. O caminho da prece e da contemplação é a estrada suave para entrar em comunhão com o Senhor. Rezar é falar com Deus no silêncio da adoração e na força do espírito que se infunde na graça divina. Tantos caminhos místicos de santificação perpassam pela prática da caridade. Servir os pobres, socorrer os abandonados e lutar pelos oprimidos. A santidade se realiza na busca do rosto de Jesus presente nos que sofrem e suportam pesadas dores. Luís Orione, grande santo da igreja, propõe uma escola de mística pelo qual as atividades santificam nossa vida. Cada ação humana nos eleva até Deus e nos insere num projeto de santificação. Agir para se elevar como se cada ação fosse uma prece e rezar como se cada oração se tornasse uma ação benemérita pela humanidade.

 

TRILHAS ILUMINADAS

Somos orionitas de coração. Temos um modelo de espiritualidade a seguir, para nos fazer melhores  cristãos e religiosos mais aplicados. A mística orionita nos insere na história vida da Igreja, pois todas as ações do padre e fundador Orione endereçavam-se para servir e exaltar o nome de Deus, em uníssono com os fiéis cristãos e católicos de todo universo. Quer servir a todos, em nome da Igreja. Para fazer a caridade não se pergunta por raças, religiões e nem mesmo por credos; mas a força propulsora de nossa ação vem da nossa fé no amor de Deus pela humanidade.

Suas palavras são propulsoras de sua mística: “acima de todos os interesses humanos, opiniões, paixões e interesses humanos, levanta-se como maior valor o Evangelho. E o Evangelho é fé, é amor universal, é civilização. É o código da verdade, da justiça e da paz. O Evangelho é o mais sublime tratado da mística cristã’.

A trilha iluminada pela mística de São Luís Orione passa a ser uma trajetória proposta para seus seguidores  religiosos, religiosas e leigos. Cada  uma de suas trilhas aponta novas direções. Por primeiro, ele trilhou este caminho, como se fosse um desbravador pioneiro de ideais. Sua unidade  espiritual com a graça de Deus torna-se um projeto de vida. Sua devoção  nos ensina a seguir os passos de Maria para servir os necessitados: esta é a mística mariana. Seu amor eclesial nos coloca como servos dos pobres na Igreja: esta é sua mística eclesial. Sua caridade nos ingressa no universo dos pobres: esta é sua mística da caridade.

Na mística de nosso Santo, somos lançados a serviço dos pobres, como missionários da caridade no seio da Igreja. A mística orionita nos insere no projeto do Reino de Deus, para servir a humanidade e louvar a Deus, com fé e coragem.

 

 

Pe. Antônio S. Bogaz

autor de Dom Orione educador