O pressuposto do seguimento de Jesus Cristo é o encontro. Este se realiza na liberdade de se encontrar com ele de maneira consciente, aberta e livre. Nesse sentido, se faz mister recorrer momentos de sublimes vocações. Todos os encontros de Jesus Cristo, nos evangelhos, foram na esfera da ressignificação da dignidade de ser humano. Foram vocações de pessoas normais, ou melhor, de pessoas carregadas de virtudes e fraquezas, no entanto, dóceis à ação santificadora do Espírito Santo que lhes possibilitaram uma vida densa de fé e caridade.
Com Pedro ou com Simão, se revela aos poucos, sem coesão, pois sabia que o amor é chama da purificação de todas as intenções individuais. Simão amava o Senhor porque lhe parecia vantagem a si mesmo na realização de seus sonhos, de seus projetos. Sonhos não somente pessoais, mas, também, universais. Todos esperavam o Messias com sua potencialidade ente o poder opressor da época. Contudo, de Simão passa a ser Pedro, rocha, pedra da Igreja. De um amor interessado ao ágape.
Com isso implica dizer que o seguimento de Jesus Cristo não se concretiza na rapidez de nossos planos, mas nos planos de Deus. O Reino é de Deus e não nosso. Entender isso é fundamental. Mas para isso é preciso conhecer o Senhor e se deixar seduzir por ele como outrora fez o profeta Jeremias. Mesmo entre penumbras se deixou contagiar pelo apelo profético que devia anunciar em favor dos sem voz. Devia ser a voz.
O encontro é essencial ao entender o Reino. Assim se deu com Maria. Quando o anjo a visitou e disse dos planos de Deus ela não se deixou levar pela emoção, mas o interrogou porque queria abraçar o projeto conscientemente. Claro que não estava tão claro assim, mas aí está o segredo do encontro, a saber, se deixar seduzir, ou seja, deixar-se penetrar a graça a ponto de ser cheia de graça ou favor, noutras palavras, se deixar conduzir pela fé à realização do Reino. Reino de Deus, por isso, deixara guiar pelo Espírito Santo. Nisso fica evidente a necessidade de um encontro com o Mestre.
E o que isso quer dizer? Quer dizer que o encontro é um conhecer e se deixar conhecer. Estes dois atos são feitos simultaneamente. Se eu não me deixo, não posso dar a vida, pois quando guardo para mim, perco, mas se a entrego, ganho, pois Jesus é vida e nele não há perda só aparente perda. Desse modo, só haverá Vida.
Outro exemplo que não se pode deixar de lado é o magnífico seguimento de São Luís Orione. Este não se deixou confundir por interesses pessoais, mas pelo interesse de Deus, ou melhor, pelo projeto de Deus que é amar a todos e, especialmente, os pobres. Estes sempre foram à paixão de Cristo. Não existiu outra paixão. Sua vida foi imbuída de amor pelos mais excluídos. Os evangelhos são claros nesse sentido. O que fez Dom Orione? O que Jesus fez. Amou os pobres. Eis aqui alguém que teve, de fato, um encontro com o Salvador. Isto se conforma com a expressão de Santa Edith Stein, filósofa e carmelita, que: “Quanto mais recolhida vive uma pessoa no mais íntimo de sua alma, tanto mais potente essa irradiação, que sai de si e encanta aos demais”.
Esse desejo se origina do encontro com o Senhor. Contudo, não foi, com certeza, um encontro somente, mas um responder ou corresponder esse chamado num caminho real no mais profundo da palavra, ou seja, encontrava constantemente com o Senhor na realidade que vivia. Via nela o apelo caritativo e, logo, tomava atitudes ante ela. Isso é maravilhoso não é? Claro que sim. Por meio de suas obras caritativas Dom Orione quer Instaurare omnia in Christo (restaurar tudo em Cristo).
Nesse sentido, dizia que “Somente a Caridade Salvará o mundo”. E isso remete a necessidade que se tem hoje de um sentido existencial à vida tão machucada pela exclusão social. Nesse mundo só existe quem tem. Quem não tem é ignorado, logo, não existe. Para Jesus Cristo e Dom Orione o pobre vale muito, pois “no mais miserável dos homens brilha a imagem de Deus”.
Então, para seguir Jesus Cristo implica um encontro, um chamado e um caminho. A primeira suscita um desejo, um se deixar seduzir pelo amor, a segunda sustenta esse desejo ou correspondência e, ainda, este se desenvolve numa inquietação constante sempre crescente até responder, e a terceira implicação é o do caminho ou carisma, ou a maneira de realizar esse projeto. Estes três passos se realizam numa simbiose vocacional surpreendente.
Em suma, se pode definir a vocação nessa dinâmica vocacional em relação o que foi dito acima. O que quer dizer vocação? Esta palavra deriva do latim (vocare) e significa chamado. Se tenho um encontro com o Senhor na abertura do meu interior ele me purifica e me faz querer sua vontade como uma resposta a realidade que me cerca. Assim foi com São Luís Orione. Ele percebeu o grito dos necessitados. Era como um irmão ao órfão e, era como um pai para os abandonados e um verdadeiro sacerdote para aqueles que precisavam de salvação. Toda vocação deve ser um sinal visível de acolhimento aos necessitados.
O exercício vocacional nasce na comunidade e se desenvolve na comunidade como uma resposta concreta ao apelo comunitário. Com São Luís Orione foi assim. Ele via a face de Cristo sofredor naqueles que ninguém via. Acredita nos desacreditados, incluía os excluídos e amava os desamados sempre por meio de Cristo. Ele era feliz e irradiava uma paz e felicidade que ouro nenhum poderia comprar. Eis aqui o segredo da felicidade humana, a caridade. Caridade remete a humanização, isto é, a ratificação do ser homem em sua totalidade, em sua abertura ao alter ego como um reconhecimento de outro eu. Com isso, se realiza o mandamento do Senhor: “Amai-vos uns aos outros como eu vos amei” (Jo 15,12). Essas ações caritativas de alteridade é um dar se dando, como dizia São Francisco de Assis é dando que se recebe.
Proceder dessa maneira, sem interesses pessoais é próprio de um coração livre, pois só na liberdade se pode construir a felicidade do outro como extensão de si mesmo. Esse modo dialético de ser é fruto de um processo de conversão ininterrupto diante do egoísmo inumano. Assim os sonhos do Mestre são assumidos pelos discípulos. Essa adesão é resultado de uma entrega e uma clareza da busca maior, a busca do amor como prêmio último. Eis: o amor é força e prêmio. Quem o deseja, já possui e quem o possui o encarna nas suas atitudes ordinárias, atitudes de um bom samaritano.
Essa reflexão repousa nas palavras do Senhor quando disse a um mestre da lei: “As raposas têm suas tocas e as aves dos céus têm seus ninhos; mas o Filho do Homem não tem onde reclinar a cabeça” (Mt 8, 20). Desanima estas palavras? Não. Elas indicam a pobreza passageira e apontam a riqueza perene do seguimento. O Filho tem a totalidade e não os fragmentos de uma vida missionária. Isso quer dizer que a preocupação do discípulo deve ser, unicamente, de “Fazer o bem sempre e a todos” sabendo das vicissitudes com suas dificuldades passageiras.
Portanto, quem encontrou com Senhor, quem se inquietou e quem deseja caminhar precisa de uma trilha de um carisma para melhor servi-lo. São Luís Orione é porto seguro porque ele percorreu “fazendo o bem sempre” como Jesus Cristo fez. Isso é amar no presente: encontro-o, ele me chama, e me disponho a segui-lo. Sou vocacionado (encontrei), sou discípulo (fui chamado), sou missionário, sou orionita (sigo um caminho). Ave Maria e avante!
Referências
BÍBLIA SAGRADA. Edição Pastoral. São Paulo: Paulus, 1991.
STEIN, Edith. Tereza a marte de Deus: Em busca de Deus. Tradução de P. Rafael Velasco Beteta. Estella-Navarra: Verbo Divino; 4ª edição, 1984.
Escrito por: Cl. Renaldo Elesbão de Almeida – Orionita.
– Instituto Filosófico São José, Província N. Sra. de Fátima – Brasil Norte – Caucaia, CE.