A videira e os ramos, modelo para as
nossas comunidades
Diácono
Osvadlir Ribeiro, orionita
O
texto da “Videira e os Ramos”, (João
15, 1 – 8) é uma alegoria, ela está inserida no contexto de uma ceia,
num momento de despedida de Jesus, pois sabendo que a sua hora chegara, onde os
discípulos acabam de tomar vinho, este feito sangue, ou seja, o fruto da vinha.
A videira nos recorda a economia, sinal de paz e felicidade, mas é, sobretudo
símbolo da comunidade.
Segundo
Brown na obra “A comunidade do Discípulo
Amado” a comunidade de João pode ser compreendida em vários momentos, ela se
fundamenta por ser a base pré-evangélica, com forte relação com o judaísmo
palestinense e com os seguidores de João Batista, os quais tendiam à
compreensão de um messianismo davídico, onde os conflitos com os judeus permeia
a vida da comunidade joanina, gerando dificuldades para a conversão dos
samaritanos.
De
acordo com o mesmo autor, a comunidade de João se torna suspeita diante do
judaísmo por acolher pessoas do grupo de judeus contrários ao Templo, assim
como os samaritanos convertidos. Os cristãos joaninos expulsos das sinagogas
não podiam adorar a Deus com os outros judeus; e assim eles não mais se
consideraram judeus, apesar do fato de muitos deles serem de ascendência
judaica. Durante a vida de Jesus, os sumos sacerdotes e alguns dos escribas no
Sinédrio eram hostis a Jesus e tiveram parte na sua morte. Os que expulsaram os
cristãos joaninos e os que estão matando são considerados como herdeiros do
grupo anterior. Assim o termo os judeus se refere a ambos. João centraliza
todas as atenções em Jesus-Messias, Verbo eterno, preexistente, Deus com o Pai.
A comunidade de João anunciava sem medo que o “Verbo era Deus” (1,1) e
professavam que Jesus Cristo era “Meu Senhor e meu Deus” (20,28).
Decididamente, a comunidade fazia opção por Jesus Cristo.
Percebemos
que a comunidade de João, o discípulo amado, é universal. No contexto em que João escreve o seu
Evangelho, salientamos que essa mesma comunidade estava em crise, dividida,
ferida, sendo perseguida, por isso era preciso ter bem claro a mensagem de
Jesus, para que acolhendo-a pudessem
permanecer unida a Ele, mesmo diante das perseguições, da hostilidade,
da não aceitação messiânica ela deveria permanecer nele, pois, somente Ele,
poderia proporcionar vida nova, esperança, vitalidade e salvação.
“A Videira e os Ramos”, é um discurso de
Jesus, dirigido aos seus discípulos e hoje a cada um de nós, e as nossas
comunidades, onde ele faz uma comparação da relação que há entre eles e a videira,
onde Jesus é o tronco, e todo aquele que o acolhe e adere o seu projeto de amor
e vida nova inaugurado por Ele torna-se seu discípulo, ou seja, são os ramos,
que unidos a videira, cujo Pai é o agricultor dono da vinha, o qual zela e
cuida. Já no Antigo Testamento, Israel é muitas vezes representada como a vinha
escolhida por Deus, a qual ele cuidou e cultivou com profundo amor, mas que não
produziu frutos bons acabou sendo abandonada, seus ramos secaram e foram
jogados ao fogo.
A
alegoria da videira foi muitas vezes utilizada pelos profetas para se referir
ao povo de Israel: O profeta Isaías compara o povo de Israel a uma videira que
não produz frutos de amor e justiça; (Is 5,1-7). Já o profeta Oséias chamou
Israel de “vinha viçosa”, porém de coração infiel (Os 10,1); Jeremias se queixa
da degeneração da vinha de qualidade (Jr 2,21).
Para
João a videira verdadeira que Israel agora não é mais, por causa de sua não
aceitação do Messias, de sua infidelidade, tornou-se os ramos inúteis. Agora o próprio
Jesus, se apresenta e assume para si a imagem da videira, declarando ser a
videira verdadeira. É o começo de um novo relacionamento de Jesus com os seus
discípulos e com aqueles que aderem a sua proposta de salvação. O novo Israel é
o Cristo e todos os que professam sua fé nele estão unidos a ele e tornan-se ramos,
que são convidados a produzirem frutos e frutos bons, e com isso permanecer no
seu amor, que gera vida, alimenta, transforma a pessoa, dá dignidade e sabe
reconhecer o outro como gente, ser que nos interpela.
Ressaltamos
que o Pai, que é o agricultor dono da vinha, também trabalha, cuida para que
ela produza os frutos que Ele espera, e se preciso for ele poda os ramos secos
e limpa os sadios para que produzam mais.
Isso nos faz compreender que existiam outras falsas vinhas que não
produziam frutos, eram ramos secos, sem vida, sem amor, sem significado de
pertença a videira verdadeira.
A
videira não produz frutos para si mesma, mas para os outros, o ramo tem sentido
e significado quando encontra a sua realização em servir os outros, tem
consciência que é preciso as podas, para que possa produzir mais e melhor.
Assim também devem ser os cristãos, unidos a Cristo, a videira verdadeira, se
sente feliz ao perceber que o amor de Deus se manifesta através dos frutos de
amor, de justiça, e de solidariedade que produz.
Portanto,
permanecer em Jesus, a videira verdadeira, é acolher a vida nova trazida por
ele, sentir-se protagonista na construção do reino, inaugurado por ele,
comprometer-se com o outro, a margem de nossa sociedade, lutar pela justiça,
permanecer nele, é ter certeza de vida nova, é estar unido à fonte, é celebrar a
caminhada, é ser sal, dar gosto e sentido a vida, ser luz, iluminar as trevas,
descortinar novos horizontes, dar significado a mensagem trazida por ele, ser
expressão de seu amor por nós. Cristo é a seiva da vida divina, que circula em
nós e por isso podemos participar do amor do próprio Pai.
Permanecer
significa ficar intimamente unido a Ele sem interromper a relação de amor, sem
desfalecer, numa relação forte e constante, que resiste a qualquer dificuldade,
sofrimento, dor e desencantos da vida. Pois, somente permanecendo unido em
Jesus, é que eles poderão fazer coisas ainda maiores, Ele garante vida plena,
exige fidelidade, compromisso, doação, dar a própria vida se preciso for pela
causa do Evangelho. Uma vez que estamos
unidos a Cristo, único tronco, verdadeiro, salvador e libertador do qual somos
alimentados, edificados, capacitados e de onde parte a nossa missão seremos
capazes de produzir frutos em abundância, e a partir daí dar testemunho dessa
adesão, deste amor que nos leva a permanecer unido a Ele, até as últimas
conseqüências.
Referências:
Bíblia de Jerusalém. 7º Ed. Paulus.
BROWN, R. E. A Comunidade do
Discípulo Amado. Paulus, 1999. São Paulo.
CALLE, Francisco Dela. A teologia do
quarto evangelho. 2 ed. São Paulo: Paulinas, 1985.
NICCACI, Alviero. Oscar Battaglia.
Comentário do Evangelho de São João. 2 ed. Petrópolis: Vozes, 1995