Relíquia em pedaços

RELÍQUIA EM PEDAÇOS

A PRECIOSIDADE DAS PESSOAS QUERIDAS

Outro dia, fomos com a Darci e o Zequita, amigos maravilhosos, visitar uma senhora doente. Lá chegando fomos recebidos pela família que nos aguardava. Não nos recordamos. Creio que foi na casa da Dona Antônio do Loureiro, um casal muito, muito querido.  

Na hora de rezarmos, a nossa alegre doentinha, pediu que fôssemos até a sala, diante da imagem de Nossa Senhora Aparecida, para fazermos nossas orações. Notamos que a imagem era muito antiga, perto de outras que eram novas e modernas, como de alguns outros santos.  O que nos chamou a atenção é que a Nossa Senhora Aparecida, era a única peça com pedacinhos quebrados, que haviam sido recolocados.

Normalmente, quando as imagens se quebram, é costume de algumas pessoas levarem  ao cemitério, ou  enterrar no quintal. Muitos até sem saber o que fazer, vão perguntar ao padre da sua paróquia o que fazer com as imagens quebradas.

Mas o fato é que a imagem estava com inúmeros pedacinhos e percebia-se claramente que fora restaurada muitas vezes, com diversas camadas de tintas de várias cores.

Depois de terminarmos as orações, perguntamos ao casal sobre aquela imagem de  Nossa Senhora Aparecida. O casal nos contou que havia ganhado no dia do casamento. Que eles eram muito pobres e a imagem foi o presente mais bonito que haviam recebido. Com o tempo até prosperaram, tiveram filhos e todas as noites o casal e suas crianças, que hoje já são pais, antes de dormir, rezavam diante da imagem.

Numa casa movimentada com pessoas, crianças, animais de estimação, limpeza, entra e sai o tempo inteiro, a imagem sofreu alguns tombos. A primeira vez que a santinha caiu, restauraram a imagem, a segunda  a pintaram, a terceira colaram com muito carinho.

Uma das filhas resolveu que era melhor trocar a imagem, mas a mãe não aceitou de jeito nenhum. Acontecesse o que fosse, colocariam sempre uma cola, a melhor possível. A imagem era uma relíquia do tempo em que nada tinham, tudo era muito precário, muito difícil. Na alma deste casal de idade, a imagem simbolicamente, era a Mãe que ali estava, era a graça concedida. Trocar a imagem, nem sonhar. Acabaram contando que a imagem tivera nove tombos e sabiam  como tinham acontecido.

Terminamos  a visita e saímos daquela casa pensando o que significa na vida da gente, os pedacinhos de nossas relíquias.

Para nós, há momentos na vida que não voltam mais; momentos de um casamento, de um batizado, de uma formatura, do nascimento de um filho, de um neto, um baile inesquecível, um natal junto com a família,  um falecimento e sabe-se mais o que…

E como ficam as pessoas em nossas vidas? Guardamos cada uma de modo especial, não queremos ficar longe de nenhuma. Elas são nossos pedacinhos da relíquia que queremos guardar em nossas lembranças. Alguns pedacinhos são maiores, outros menores, mas todos são parte de uma vida. Como a imagem da Santinha, não queremos dispensar as pessoas queridas e as coisas que amamos. Elas estão coladas em nossos sentimentos. Nem são úteis, mas dão sentido à nossa vida. Será que ainda existe gente neste mundo que só valoriza as coisas úteis ou vive em função da "tirar proveito", até dos infelizes. Não é uma pessoa, é um espectro de gente. 

Não queremos nos desfazer de nada, nem dos pedacinhos alegres que sobraram e nem dos tristes, pois todos acabam formando a nossa relíquia.

Neste sábado, dia de Nossa Senhora Aparecida, padroeira do nosso povo, busquemos os pedacinhos de nossas relíquias, muitas vezes empoeiradas. Vamos pensar nas pessoas que amamos, nos amigos, naqueles seres maravilhosos que passaram pela nossa vida. Alguns que são pedacinhos pequenos, outros maiores, mas todos juntos que, colados ou não, acabaram se completando em nossa relíquia. Assim podemos pensar como é bom termos tantos pedacinhos, tantos amigos, como relíquias. Isso, por certo, é coisa de Deus! Faça brilhar os pedacinhos da sua relíquia.

 

Pe. Antônio S. Bogaz (orionita) , doutor em filosofia e teologia

Prof. João H. Hansen, doutor em ciências da religião