Pirataria

PIRATARIAS NA PRAÇA

A ARTE DE DESACOMODAR

Vivemos em tempo de pirataria. Muito, muito mais grave que as piratarias dos ingleses, que até inventaram os capitães piratas. Aqueles piratas de um olho cego, coberto com uma viseira esquisita e um papagaio de estimação no ombro do olho tapado.

– Eu sou contra todo tipo de pirataria.

– Eu sou meio a favor. Filmes piratas são um absurdo.

– Qual nada, até falaram que a pirataria de alguns filmes ajuda a divulgar o filme.

– Me falaram que até o filme Tropa de Elite ganhou muita publicidade porque se espalhou antes pela pirataria. Senão teria passado desapercebido.

– Eu vou ser contra a pirataria, quando tiverem menos luxo em Hollywood. Basta que vendam mais barato seus produtos.

– Mas, quem investiu para produzir, como os remédios?

– Claro, eles precisam ter lucros. Mas eles  são podres de ricos, estes laboratórios. Deviam visar mais a saúde e menos os lucros enormes. Lembra quando quebraram a patente dos remédios contra a AIDS?

– Imagina, as pessoas morrendo pela epidemia e os poderosos segurando os remédios, para lucrar mais e mais

A conversa foi terminando, mas os argumentos se aguçavam. Vivemos em tempos de altas produções e de patentes burocráticas excessivas.

Temos a pirataria de produtos que se comercializam. Temos a pirataria de médicos estrangeiros, disse alguém. Tem a pirataria mesmo de religiões.

– Religião pirata?

– Claro é verdade. Tem religiões que são totalmente piratas.

– Pirataria é quando o mercador vende um produto falsificando sua origem, alegando ser ele o dono da patente. Não é como cópia de uma obra de arte, mas é uma cópia que simula ser verdadeira. Ele copia e vende como se fosse ele o inventor, burla a qualidade  e ludibria os consumidores.

– Vejam, os médicos estrangeiros.

– Que horror, isso é bem diferente?

– Tem gente que diz que os médicos cubanos é pura pirataria.

– Sim, mas não custarão centenas de milhares por mês para os cofres públicos. E podem ser até mesmo melhores, se derem mais atenção aos doentes.

 A pirataria tem seu valor altamente positivo. Quando somos proprietários das patentes (que nós mesmos criamos e registramos em nossos cartórios particulares) ficamos irritados com a pirataria. Inegável, porém, que a pirataria desacomoda os velhos comerciantes.  A vinda de médicos estrangeiros (que venham muitos!) fará com que os brasileiros sejam mais atenciosos, senão mudamos de consultório e vamos aprender espanhol, francês e alemão.

Eu também gostaria que não houvesse outras religiões algumas de apreciado valor outras verdadeiramente deploráveis. Mas estes grupos religiosos alternativos fizeram com que a nossa igreja ficasse mais atenciosa, mais acolhedora e mais dinâmica. Hoje estamos mais abertos, mais amáveis e muito mais dedicados aos  fiéis.  A pirataria nos desacomodou. Haverá de desacomodar tantos outros profissionais , fará abaixar o preço dos  produtos importados.

– Porque pagar tão caro, se por um preço bem menor, posso ter a mesma qualidade?

– Ninguém mais faz fotocópias, pois o valor das fotocópias quase se igualou com o preço do livro, bem bonito, bem encadernado.

– Será que teremos que acolher mais produtos estrangeiros? Que venham, se forem mais econômicos e acessíveis a todo povo. Recordam quando o Sarney proibiu a importação da informática? Nossos produtos eram inferiores e muito mais caros.  Um dia desses, será que teremos que importar parlamentares e governantes estrangeiros, mais humildes e menos corrompidos?

Sou contra a pirataria, não mudei minha posição técnica. Mesmo que ela nos faça rever nossos preços e a qualidade de nossos produtos. Sou contra a pirataria, sobretudo quando tiver um carimbo de qualidade no dorso do produto e mesmo  assim ele for muito caro e de qualidade ruim. Dessa pirataria,  livre-nos Deus.

 

Pe. Antônio S. Bogaz (orionita) , doutor em filosofia e teologia

Prof. João H. Hansen, doutor em ciências da religião