GRANDES ESCOLHAS NA VIDA
A gatinha, o pitbull e os nossos sonhos
Você pode imaginar a reportagem e o entusiasmo do repórter: gatinha amamentando um pitbull. Ela tinha gerado uma ninhada de quatro gatinhos e mesmo assim adotou o cão de apenas uma semana, que ficara órfão.
Não é a primeira vez que vemos isso, mas, convenhamos pitbull e gato não se enquadram muito bem na categoria de “amigos”. Conversando entre nós, recordamos também o contrário: uma pitbull que adotou um gatinho para amamentar. Bem, devemos anotar que existem filmagens violentas de um gatinho sendo devorado por um cão feroz dessa raça.
Primeiramente o que pensamos da mamãe gata é o que acontecerá com ela quando o pitbull crescer. Bem, é melhor nem pensar, pois este gesto lindo que a natureza tem, muitas vezes não acaba no refrão dos contos antigos: “foram felizes para sempre”. Que pena que a realidade seja assim tão diferente da nossa fantasia.
Tive uma prima que casou e foi morar numa fazenda com o marido. Um belo dia, ele lhe deu um bezerro de presente. Afinal, ela o ajudou a nascer no parto de uma vaca premiada. Apaixonou-se pelo animalzinho. Onde minha prima ia, o bezerro ia atrás, brincando, praticamente conversando com ela. Acontece que o bezerro foi crescendo, crescendo… e mesmo assim vinha sempre brincar com ela. Só… que um dia, pensando ainda que era o amiguinho mais querido dela, resolveu fazer-lhe um carinho maior e jogou-a longe. Bem, uma perna quebrada, muitos ferimentos, cirurgia, pinos, fisioterapia e meses de recuperação. O marido da minha prima contou para todos na família que deu o touro, mas a maioria achou que virou filé em alguma churrascaria.
A natureza dos animais, bem como a nossa, é realmente complicada. Muitas vezes, acreditamos que nosso instinto é paternal ou romântico e por isso vai dar tudo certo em nossas vidas. Nossos propósitos são os mais elevados, seja quando fazemos juras de amor no altar, quando iniciamos uma peregrinação em grupos ou mesmo quando iniciamos um novo empreendimento em nossa vida.
Com o tempo, o romantismo do primeiro sim é colocado à prova. Muitas vezes, a duras provas. Por isso, precisamos sempre retornar aos nossos primeiros propósitos, nosso ideal originário. É a renovação de nossos ideais a cada dia que perpetuam nossas alianças. Esta renovação constante faz a perenidade do matrimônio, a longevidade das amizades e a restauração de nossas feridas, para sempre recomeçar.
Parece bem complicado. E de certo modo é mesmo muito complexo: nossas escolhas parecem ser certas naquele momento, como a gata adotando o pequenino pitbull ou aquela prima apaixonada pelo bezerro, mas os pactos precisam ser renovados, como os sapatos que se lustram para estarem sempre brilhantes, como novos.
Que pena que tantas vezes as coisas mudam tanto; os galanteios se tornam desaforos, os elogios se vestem de ironias e as palavras em provocações. Devemos, no entanto, continuar confiando, pois a perda de esperança é um desastroso sinal de velhice. Mesmo que o pitbull ataque a gatinha, precisamos continuar acreditando nas pessoas, nos seus propósitos e nas suas boas intenções. Pode ser que um dia o mesmo pitbull proteja sua “ama de leite” de cães atrozes. Mas, sobretudo, inscreva-se nas páginas da vida, que a generosidade insiste em sobreviver nos corações mais puros. Pode ser o seu coração.
Se os frutos forem amargos, desanime não. Todos erramos e recomeçar é sinal de grandeza espiritual. Vamos retornar sempre aos nossos primeiros ideais, crendo que o mundo é maravilhoso e as pessoas são muito queridas.
De fato, existem situações difíceis na vida, que nos colocamos na mais cruel das interrogações existenciais: “Onde foi que eu errei?”.
Não é para desanimar ou se condenar. Simplesmente é um impulso para começar de novo.
Pe. Antônio S. Bogaz (orionita) , doutor em filosofia e teologia
Prof. João H. Hansen, doutor em ciências da religião