AMARGO RIO DOCE
O DRAMA DA BARRAGEM DE MARIANA
Duas das nossas vizinhas estavam vendo televisão, cada uma em sua casa, quando apareceu o drama da barragem de Mariana. Mais um drama na periferia social de nossa sociedade. Afinal é sempre nas periferias que se noticiam falta de luz, de água, enchentes, deslizamentos e tantos. Mas quando ouvimos uma notícia, parece que não entendemos direito o que foi falado. Assim, uma dessas senhoras que tem parente na região de Mariana, ficou apavorada pensando que sua prima-irmã e toda a família tinham perecido no acidente.
Realmente vendo a tragédia que se desenrolou, percebemos que é o maior acidente ecológico do país. Um espetáculo dantesco, um rio de novecentos quilômetros completamente poluído, morto. Um rio que agoniza, água que se transformou em lamaçal. Lamaçal não de terra, mas de minérios venenosos.
A vizinha que tinha família na região, correu para a casa da amiga. Ambas começaram a chorar desesperadamente. Chamaram-nos e aos poucos foram se acalmando. Aos poucos fomos entendendo que a tragédia não era no centro de Mariana onde a prima morava.
Nesta hora, telefona-se para todos e ninguém nada atende. Foram aproximadamente meia hora de aflição, até que uma das filhas da prima atendeu e disse que todos estavam bem. Aliviou-nos ao saber que a tragédia tinha sido alguns quilômetros de lá. Ouvimos a conversa, pelo celular que emprestamos. Colocaram no viva voz, para que todos pudessem acompanhar o que estava acontecendo em Mariana:
– Vocês estão bem?
– Sim, tia, tudo bem…
– Mas a televisão mostrou a barragem e a lama correndo por todo canto e até um carro em cima da árvore.
– Tia, a tragédia é muito grande mesmo, mas fique tranquila, estamos todos bem. A tragédia não chegou até nós. Estamos no vale de cima. Os amigos de nossa paróquia estão no nosso salão de festas ajudando os que se salvaram.
– Entendo, mas diga para a sua mãe me ligar mais tarde, ou eu não vou dormir.
– Está bem, tia, eu falo. Reze pelas pessoas que estão sofrendo, que perderam casa e tudo o mais…
– Vou rezar, vou rezar.
Vimos que as duas vizinhas estavam bem e fomos embora. Comentamos sobre a tragédia. Durante a semana, devido o atentado em Paris, as notícias foram divididas e agora vemos como é grande a tragédia que ocorreu em Mariana. O rio está com tanta lama que não se mistura mais na água. Os peixes e animais que habitavam ao redor do rio, todos mortos. A fauna e a flora definitivamente morta e sem condição de recuperar as espécies. A extensão é longa, passa por Mariana e vai desaguar somente no Espírito Santo.
Falam em um bilhão que a empresa deverá pagar de multa e indenizações. Mas para uma tragédia destas que fere a água que é levada para as torneiras de toda esta imensa região e da contaminação que feriu todo o rio e arredores, este dinheiro não dá nem para corrigir o primeiro quilômetro da desgraça.
Infelizmente não confiamos em nossos dirigentes, nem nesta empresa que segundo o Estadão, os deputados ganharam dela seis milhões de reais para se elegerem e fazer sua manobras políticas. Mais uma vez se desvela como o sistema de governança de nosso país está maculado pela corrupção. Como se diz: "procura-se um político honesto".
Uma tragédia que mata pessoas, fere a ecologia e certamente vai tudo acabar em pizza. Mais uma vez, como todos os desmandos de nosso país. Somente vão sofrer as pessoas que precisam da água, da casa que habitavam e da horta no quintal. Vão sofrer os pescadores que moram na beira do rio e, é claro, as famílias pobres que foram invadidas pela lama de minérios. Os poderosos e os políticos que lucram com a tragédia continuarão a se banharem em suas piscinas transbordantes da água da iniquidade. Não é somente a política suja brasileira, são as empresas sujas também que não pensam que essas coisas podem acontecer e acontecem. São os pactos da indecência. Ganância.
Estamos no momento, vendo a dor das pessoas e vendo a tristeza deste rio. Até quando ficarão impunes estas empresas e estes políticos? Nosso vizinho ficou tão compadecido, que disse que gostaria que todos os políticos brasileiros tivessem sidos tragados pela lama. Qual nada, amigo, disse outro: eles são a lama de nosso país. Caras sujas. Olha a que chegamos, estamos perdendo a ética! Amargo Rio Doce.
Pe. Antônio S. Bogaz (orionita), doutor em Filosofia, Liturgia e Sacramentos e
Teologia Sistemática – Cristologia
Prof. João H. Hansen, doutor em Literatura Portuguesa e
Ciência da Religião e Pós-doutor em antropologia