AS FOGUEIRAS JUNINAS
Quando se olhava o resto da fogueira, na manhã friorenta desta sexta de São João, nem parecia aquele fogaréu na noite anterior. As labaredas dançavam, vestidas de vermelho e amarelo, entremeadas de tons azulados, antes de virarem a “feia fumaça que cobre as estrelas”. Pareciam, as labaredas, bailarinas que realizam prodígios com suas vestes coloridas. Ontem, então, na manhã da sexta feira, eram os restos mortais do que fora uma grande fogueira, reunindo os “caipiras”, comendo pipocas, vinho quente e tantos quitutes, que fazem a delícia desta festança. Sobravam restos de tições, algumas brasas brigando para fazer labaredas e talvez algumas batatas, perdidas entre as cinzas.
– Vamos ver quem acha mais batatas, disse o João Paulo ***
– Vai ser difícil, ontem as batatas existiam, mas agora, depois dessa fogueira, a noite inteira… – falou a Lívia, neta da Neusa.
– Imagina que queriam apagar a fogueira – falou a Larissa, enquanto procurava batatas.
Enquanto vasculhava as cinzas, procurando batatas, Murilo se voltou e falou:
– Apagar a fogueira, povo doido.
-Achei uma batata -gritou a Clarinha do Du e Bruna – achei.
– Também achei uma – bradou o Pedrinho, irmão do Ari. Êta menino bacana.
Depois de tanto procurarem, acharam algumas batatas. Algumas, no meio das cinzas, não muitas, poucas.
Pareciam o pobre Diógenes que caminhava, pelas ruas de Atenas, com uma tocha acesa no meio do dia, como se fosse um doido varrido.
– Tocha acesa, dia e noite, Diógenes – caçoavam as raparigas.
– Procuro um homem honesto. Deve ter alguns.
Bem… ligamos a televisão, abrimos os jornais e revistas, ouvimos o rádio e deslumbramos o universo dos nossos governantes. Quanto mais vamos abrimos documentos, mais descobrimos a imensidão de ladrões governando o país, os estados e as cidades. Bem que dava para desconfiar como os políticos foram enriquecendo tão rapidamente. Gente que trabalhava em pequenos comércios, eram funcionários públicos, tinham um pequeno sítio e hoje estão podres de rico, quer dizer, ricos podres.
Estava mais fácil encontrar batatas sob as cinzas, porque encontrar honestidade sob as cinzas da desonra dos governantes parece destruir as esperanças. Claro que tinha batatas, claro que existem governantes honestos, e muitos. Mas tem horas que é difícil encontrar. Foi-se criando um sistema abominável, deputados e vereadores inventando para si salários enormes, parlamentares se enchendo de assessores para desfrutá-los, governadores e prefeitos enchendo as prefeituras de secretarias e autarquias para empregar os partidos de coalisão. Basta ver que cada secretaria está entregue para um dos partidos da coalisão. E se não tiver secretarias, inventa-se mais uma, não é problema. A pior corrupção não é o desvio dos bens públicos, mas a criação de leis para espoliar o povo. Tem pior, muito pior é ouvir suas mentiras, do tipo, está tudo ótimo. Parece que vivem em outra cidade ou só vão aos bairros pobres para inaugurações Aliás, está iniciando a bateria de inaugurações, de coisas mal terminadas, de trechos de ruas. Ninguém acredita, nem os próprios governantes, mas nutrem-se de imprensas compradas e bajuladores, os tais comissionados, os tantos cargos de confiança. Pobre Brasil. Pobre povo brasileiro que se arrebenta de trabalhar para alimentar vaidades dos seus mandatários.
A história será nosso juiz e estes nomes maravilhosos das várias operações e das operações escondidas terão vergonha de seus próprios sobrenomes. Um filho vai ter vergonha de dizer na escola o seu sobrenome, pois recordará um pai desonesto, esquecido da honra. E os bajuladores e comissionados estarão em outras bajulações.
Desista não, caro Diógenes. As crianças não desistiram e encontraram batatas sob as cinzas. Não eram muitas, mas tinham batatas sob as cinzas. Batatas apetitosas. Não desista, velho Diógenes, tem governantes honestos e tem muitos. Estão escondidos sob as cinzas. Mas tome cuidado por onde andam. Em algumas áreas da cidade, nas esplanadas e nos paços, como usurpam nossos impostos, poderão mesmo roubar a sua tocha.
Pe. Antônio S. Bogaz (orionita), doutor em Filosofia, Liturgia e Sacramentos e
Teologia Sistemática – Cristologia
Prof. João H. Hansen, doutor em Literatura Portuguesa e
Ciência da Religião e Pós-doutor em antropologia